“MaXXXine”: No clima dos anos 80 e repleto de referências à cultura pop, chega ao fim a trilogia de Ti West | 2024
Não é exagero afirmar que “X – A Marca da Morte”, lançado em 2022, pegou muitos amantes do horror de surpresa. Dirigido por Ti West, cineasta até então não muito conhecido do grande público, o filme dobrou a aposta ao lançar, no mesmo ano, a sua prequela, “Pearl”, que muitos consideram ainda melhor que o original. O curto intervalo entre os lançamentos não foi nada usual, assim como as diferenças de tom entre as produções. Enquanto “X” homenageia os primórdios do slasher, “Pearl” mistura de forma curiosa e inventiva os gêneros horror e fantasia. No entanto, se antes a produção tinha toda a cara do cinema independente e autoral comumente associado à produtora A24, o êxito transformou completamente o andamento do projeto, elevando “MaXXXine” ao status de mainstream.
Ambientado na década de 80, em Hollywood, acompanhamos mais uma vez a trajetória de Maxine Minx (Mia Goth). Decidida a alcançar o estrelato, ela vê sua grande chance ameaçada quando um misterioso assassino em série coloca em risco não apenas sua vida, mas também traz à tona segredos sombrios do passado.
Alternar estilos entre os trabalhos é relativamente comum para cineastas; no entanto, em uma trilogia ambientada no mesmo universo, essa abordagem é pouco explorada no cinema em geral. “X” evoca com maestria os anos 70, “Pearl” remete aos anos 20, e “MaXXXine” mergulha na fábrica de nostalgia dos anos 80, década que tem sido explorada na cultura pop há pelo menos cinco anos, em diversos formatos. Ti West capta habilmente as contradições desse período, especialmente no contexto político da era Ronald Reagan, contrastando com a vibrante estética queer em alta. Artistas como David Bowie, Madonna, Prince e Freddie Mercury sintetizam essa imagem fixada no imaginário popular, refletida na vestimenta, acessórios e padrões de comportamento ditos “subversivos”. No entanto, o filme comete alguns exageros ao querer evidenciar constantemente essa abordagem. Quando uma pessoa usa um telefone público, há um plano detalhe na ficha e no modo circular de discar o aparelho. Nas sequências dentro da locadora, o foco é nas fitas VHS. Ao caminhar pelas ruas, foco no neon presente nas fachadas. Isso ocorre durante todo o tempo, tornando essa ênfase quase um fetiche do diretor.
Outra constante na trilogia é a maneira como a sexualidade é abordada. Nos dois primeiros filmes, a repressão é um fator decisivo para os conflitos, e nesse novo capítulo, de certa maneira, também. Há um componente religioso, mas também acompanhamos a personagem em busca da fama na grande indústria, tentando se desvincular de seu histórico no cinema adulto. É nesse ponto que o filme se torna potencial refém de si mesmo. Logo na primeira cena, após importante entrevista para conseguir um papel, a diretora pede que ela mostre os seios. Com naturalidade, ela mostra, mas a câmera desvia o olhar. Fica a questão: por quê? Seria a câmera um aliado de Maxine, desviando nosso olhar e assim evitando a hipersexualização, ou uma escolha artística equivocada, uma vez que essa sexualidade contida corrobora com o ressentimento de grupos conservadores quanto aos corpos femininos? O filme trabalha com essas duas ideias, mas elas pouco dialogam entre si. Se, textualmente, temos uma história adulta, visualmente, o projeto parece casto.
Merecidamente, Ti West ganhou uma projeção enorme, porém, esse êxito não pode ser creditado apenas a ele. Mia Goth já desponta como um novo símbolo do gênero horror, além de ter colaborado com a produção e a visão criativa. Em cada filme, o foco na figura da atriz ficava mais nítido, e em “MaXXXine” esse direcionamento está mais claro do que nunca. Mais uma vez, ela sustenta perfeitamente a responsabilidade, mostrando-se essencial para o sucesso da trilogia.
Com a história concluída e as partes devidamente conectadas, é possível ter uma noção do todo, e, muito embora o resultado final seja positivo, “MaXXXine”, mesmo sendo a etapa mais ambiciosa e mais carregada de expectativas, revelou-se um declínio significativo. Longe de ser ruim, mas ainda inferior aos anteriores. Não o suficiente para amargar a experiência, mas, sem dúvida, acrescentou um gostinho agridoce.