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“Drácula: Uma História de Amor Eterno”: paixão e melancolia moldam nova adaptação do clássico de Bram Stoker | 2025

O Drácula, talvez uma das figuras mais icônicas do imaginário cultural, se consolidou muito cedo como presença recorrente nas telas. Sua primeira incursão cinematográfica conhecida ocorreu na produção húngara “Drakula halála” (1921), hoje considerada perdida. No entanto, foi “Nosferatu” (1922), de F. W. Murnau, que firmou a imagem do vampiro no cinema ao oferecer uma adaptação não autorizada do romance de Bram Stoker e estabelecer um marco estético e narrativo para o gênero. Poucos anos depois, “Drácula” (1931), estrelado por Bela Lugosi, deu forma definitiva à iconografia do personagem, fixando o sotaque, a postura e a aura aristocrática que se tornariam referência para quase todas as encarnações posteriores.

Se concentrarmos o olhar nos últimos anos, “Drácula de Bram Stoker” (1992), de Francis Ford Coppola, resgatou o personagem em uma abordagem luxuosa e romântica, misturando sensualidade, horror e espetáculo visual. Já o mais recente “Nosferatu” (2024), de Robert Eggers, ressurgiu com rigor expressionista e atmosfera de horror. Entre adaptações e releituras, as obras mais marcantes costumam se apoiar em comentários sociais ou revisões críticas, preservando a capacidade do mito de dialogar com seu tempo. Em “Drácula: Uma História de Amor Eterno”, Luc Besson rompe com essa tradição e aposta em um exercício nostálgico, mais interessado em recuperar o esplendor de um romantismo literário do que em atualizar a lenda para o presente.

O filme se ancora em um romantismo próximo ao “Sturm und Drang”, movimento literário alemão do final do século XVIII que defendia a primazia da emoção sobre a razão e celebrava o impulso vital de viver intensamente, mesmo que isso levasse à autodestruição. Essa estética exaltava paixões arrebatadoras, conflitos existenciais e personagens movidos por sentimentos extremos, muitas vezes incapazes de se adequar às convenções sociais. É nesse espírito que surge “Os Sofrimentos do Jovem Werther”, de Goethe, obra emblemática do período, em que um amor impossível corrói o protagonista até levá-lo a um desfecho trágico. Em “Drácula: Uma História de Amor Eterno”, o conde Drácula (Caleb Landry Jones) incorpora essa mesma intensidade: um melancólico, devastado pela ausência de Mina (Zoë Bleu), cujo desejo absoluto e inalcançável molda cada gesto e decisão. A narrativa se apresenta como uma fábula trágica, visualmente arrebatadora, mas cuja beleza raramente encontra profundidade dramática à altura, deixando a sensação de que, sob o esplendor das imagens, falta a pulsação que sustentaria a força emocional dessa paixão.

A ausência de terror é deliberada, mas não é compensada por um romance capaz de carregar sozinho o peso da narrativa. Sequências como a invasão ao monastério, em que Drácula enfraquecido recupera a juventude ao enfeitiçar freiras, revelam um apuro formal que não se converte em emoção duradoura. O trabalho de Caleb Landry Jones é competente, com presença magnética e voz calculada, mas não acrescenta frescor a um papel que já encontrou interpretações mais marcantes no passado. É um desempenho sólido, mas de efeito passageiro.

O restante do elenco sofre com a falta de substância. O padre caçador interpretado por Christoph Waltz percorre uma trama sem mistério real, enquanto Mina e outras figuras femininas aparecem reduzidas a funções decorativas. Ao escolher centrar-se no amor eterno entre Drácula e Mina, Besson simplifica um mito que historicamente abrigou camadas de metáforas sobre poder, medo, desejo e controle. O resultado é um filme que, embora tecnicamente impecável e visualmente sedutor, deixa escapar a oportunidade de reinventar o personagem para um público contemporâneo, acomodando-se em um retrato belo, mas artisticamente seguro demais para provocar impacto duradouro.

Rafa Ferraz

Engenheiro de profissão e cinéfilo de nascimento. Apaixonado por literatura e filosofia, criei o perfil ‘Isso Não é Uma Critica’ para compartilhar esse sentimento maravilhoso que é pensar o cinema e tudo que ele proporciona.

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