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“M3GAN 2.0”:  sequência atualiza o sistema, abandona o horror e aposta na comédia | 2025

Alguns filmes parecem tomados por uma necessidade quase cômica de parecer relevantes. Se apropriam do discurso da vez, encenam dilemas contemporâneos com olhos arregalados, como se cada cena fosse um convite ao debate, embora tudo indique que não há, de fato, muito o que dizer. “M3GAN 2.0” se insere nessa categoria com um entusiasmo quase juvenil. Soa como o projeto ambicioso de alguém que, recém-iniciado nas paranoias digitais, resolve filmar um alerta para o fim do mundo.

Se no primeiro filme o elemento da comédia já era bastante presente, em “M3GAN 2.0” ele é plenamente abraçado. A questão é que, apesar do humor seguir em cena, algo importante se perdeu no caminho. No original, M3GAN era assustadora, mas também absurdamente ridícula, e o filme parecia confortável com essa ambivalência. Havia ali uma fagulha de autoconsciência que tornava o absurdo divertido. Aqui, tudo se dissolve numa névoa de pretensão. A mistura de produto e paródia dá lugar a um teatro de intenções sérias, onde cada cena parece ansiosa por provar que há algo profundo em jogo, mesmo quando não há nada além de pose.

Reinventar-se, por si só, não é o problema. “O Exterminador do Futuro” fez isso com maestria ao transformar seu vilão em protetor no segundo filme. “Brinquedo Assassino” também soube virar a chave, abandonando o horror puro depois do terceiro longa e mergulhando na comédia em “A Noiva de Chucky” e “O Filho de Chucky”, com plena consciência do próprio ridículo. Já “M3GAN 2.0” não parece operar essa virada com clareza. Sua mudança de tom não soa como decisão criativa, mas como sintoma de uma crise de identidade. Em vez de assumir uma nova direção, o filme hesita, tropeça e tenta parecer mais esperto do que realmente é.

Mas onde o filme realmente se esborracha é na completa incapacidade de sustentar qualquer construção de personagem, especialmente naquela que deveria funcionar como centro emocional da história. Gemma (Allison Williams), que no primeiro filme ao menos flertava com a ideia de uma cientista genial travada emocionalmente, retorna agora como um desastre ambulante com PhD em decisões ruins. Não é que ela erre. É que ela erra tudo, o tempo inteiro, e com uma convicção que faria inveja a qualquer coach de LinkedIn. O roteiro ainda tenta empurrá-la como mente brilhante, mas entrega uma mulher que parece não ter aprendido absolutamente nada com o que viveu no longa anterior. A dinâmica com Cady (Violet McGraw) é tão fria quanto uma conversa entre desconhecidos no ponto de ônibus. A menina virou adolescente e isso já bastaria para criar fricções interessantes, mas o filme sequer tenta. O vínculo entre as duas, que deveria ter se tornado mais próximo, desaparece numa névoa de diálogos que beiram o patético.

Mesmo nas tentativas de equilibrar seus tropeços com algum acabamento técnico, como efeitos visuais eficientes, lutas relativamente bem coreografadas e um design de som funcional, o filme logo se perde nas próprias escolhas. A montagem, agitada demais, dilui qualquer tentativa de envolvimento. As cenas de ação se tornam blocos fragmentados, com cortes sucessivos que impedem o olhar de se fixar, como se houvesse medo de deixar a imagem durar tempo suficiente para ser compreendida.

No fim, o susto virou sermão e a sátira, antes exagerada e divertida, deu lugar a uma tentativa sofrida de parecer relevante. “M3GAN 2.0” se comporta como um protótipo instável, uma versão beta emperrada que levanta bandeira sobre os perigos da IA, mas entrega apenas o artificial, deixando a inteligência de lado. Aparentemente, o pensamento crítico ficou de fora do upgrade. E a lucidez, essa desligou por inatividade.

Rafa Ferraz

Engenheiro de profissão e cinéfilo de nascimento. Apaixonado por literatura e filosofia, criei o perfil ‘Isso Não é Uma Critica’ para compartilhar esse sentimento maravilhoso que é pensar o cinema e tudo que ele proporciona.

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