Festival do Rio 2024: “Os Enforcados”, de Fernando Coimbra | 2024
O primeiro longa de ficção de Fernando Coimbra chegava ao Festival do Rio há onze anos. “O Lobo Atrás da Porta”, que viria a ser lembrado em listas de melhores filmes brasileiros ano após ano, recebeu o Troféu Redentor em duas categorias, incluindo melhor filme e melhor atriz para Leandra Leal. Mais de uma década depois Coimbra retorna ao Festival Carioca com um projeto que ele chama de filhote de “O Lobo Atrás da Porta”. “Os Enforcados”, que chega com enorme burburinho e causando tanto impacto quanto o filme anterior, também é um Thriller Psicológico repleto de violência e crítica social, mas com alguns elementos mais explorados aqui do que em seu filme anterior.
Inspirado nos escritos de Shakespeare, mais precisamente na tragédia de Macbeth, o filme acompanha Regina (Leandra Leal) e Valério (Irandhir Santos), um casal que vive uma vida abastada e mora na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. Desde a morte do pai de Valério, o maior mafioso da cidade, eles procuram uma saída do buraco sem fundo que é o negócio da família. O problema é que o casal tem despesas e dívidas para quitar e o tio de Valério, Linduarte (Stepan Nercessian) insiste que o sobrinho assuma o negócio. Numa noite ‘acidental’, os dois encontram uma solução para o problema: matar o tio e vender o negócio. Mas ao fazer isso, mergulham ainda mais na violência da qual queriam escapar.
Diferente do longa anterior, Coimbra, ainda que lance mão de muita violência gráfica e altas doses de suspense, aposta também em tons de ironia, recaídos todos na personagem de Regina, brilhantemente defendida por Leandra Leal, que mais uma vez reforça sua versatilidade, passeando por infinitas facetas, que vão do drama até o humor. Sua performance tem nuances que nos confundem, que, ao mesmo tempo que cria um forte contraste com todo aquele clima de violência e crime, também nos deixa em dúvida se eu ar de aparente ingenuidade e ignorância não faz parte do jogo proposto por Coimbra.
Impecável na concepção e na realização, “Os Enforcados” trata de um Rio de Janeiro mergulhado na contravenção, onde o jogo do bicho, a milícia e a polícia formam uma amálgama difícil de ser destrinchada. Coimbra cria um retrato debochado, caricato e repleto de sarcasmo da sociedade de classe média carioca, mas com o tempero dos bons filmes policiais. A fotografia, que potencializa o clima de thriller e as altíssimas doses de violência crua, firmam o nome de Fernando Coimbra entre os grandes realizadores do gênero. Coimbra mostra um Rio que está lá pra todo mundo ver, mesmo que uns e outros escolham fechar os olhos, sobretudo o poder público.