Bernadette: Catherine Deneuve vive a primeira dama “Madame Chirac” em cinebio bem humorada com tom satírico | 2024
É raro uma cinebiografia focar na Primeira Dama da França em vez do vigésimo segundo presidente francês, Jacques Chirac. Sob o ponto de vista feminino e bem humorado, a diretora estreante Léa Domenach propõe um mosaico de momentos importantes na vida de Bernadette Chirac ao longo dos anos 90 e início dos anos 2000 (Jacques Chirac foi presidente de 1995 a 2007). Com um constante tom irônico e debochado, a musa Catherine Deneuve prova que ainda consegue sustentar um filme inteiro com sua força e elegância na tela. “Madame Chirac”, como era conhecida, se recusava a ser uma esposa figurante e decorativa. Pelo contrário, aspirava se envolver em projetos sociais, alavancar sua imagem pessoal e desviar dos escândalos extraconjugais nos quais seu marido se envolvia.
Na obra, quem interpreta o presidente Jacques Chirac é o ator Michel Vuillermoz, uma composição carrancuda que constantemente troca farpas com Bernadette. Além de se parecer fisicamente com o ex-presidente, Vuillermoz aqui é um mero coadjuvante, já que a narrativa decide se concentrar nas idas e vindas de Madame Chirac em seus eventos sociais, na sua família e até na sua preocupação com a moda. Ela tinha verdadeira adoração pelas roupas do estilista Karl Lagerfeld. A liberdade criativa que o filme toma faz o público sempre questionar o que é real e o que não passa de ficção, tudo em tom bem humorado e com direito até a um coral de igreja que canta músicas narrando fatos que estão acontecendo na vida de Bernadette. Este elemento estilístico é inclusive apresentado na abertura do filme, mas depois desaparece sem qualquer razão ou justificativa, retornando brevemente apenas no final da narrativa.
Se existe um ponto fraco na obra como um todo é que o vai e vem de fragmentos da vida de Bernadette deixando o storytelling superficial, não permitindo que o público possa criar afeto ou se conectar emocionalmente com as personagens, com exceção de Bernadette. A trama tenta pincelar a relação tumultuada que Jacques e Bernadette tinham com suas duas filhas, Claude Chirac, que exercia um cargo de assessora pessoal do Presidente, e Laurence, mas falha ao explorar essas passagens íntimas da família.
É inegável que há algo irresistível em relação ao timing cômico de Deneuve nesta cinebiografia. Não só ela parece estar se divertindo no papel como ainda mostra vigor para assumir personagens icônicas e complexas aos 80 anos de idade. Bernadette, em determinado momento, decide criar um plano de “rebranding” de sua imagem com a ajuda de Bernard Niquet (Denis Podalydès), responsável pela área de comunicação dos Chiracs. As táticas desse plano incluem uma aproximação da primeira-dama de uma boy band francesa, 2Be3, até sua frequência assídua em casas noturnas parisienses, ambas estratégias falhas e comicamente desastrosas.
“Bernadette” foi indicado recentemente ao “Oscar francês”, o César, na categoria de melhor filme de um diretor ou diretora estreante. Saiu de mãos abanando da cerimônia após perder para o filme “Junkyard Dog” (2024). De fato, a cinebiografia de Madame Chirac é apenas um programa agradável e uma representação cômica frágil da vida da Primeira Dama, alavancada pela atuação acima da média de Deneuve, a nossa eterna musa “La belle de jour”.