“Nada”: longa se ancora num “soft sci-fi” à brasileira guiado por melancolia e reflexão | 2025

Marcando a estreia de Adriano Guimarães na direção, “Nada” se insere no campo do “soft science fiction”, abordagem que, embora incorpore aspectos ligados ao universo científico, privilegia questões sociais, psicológicas e filosóficas, sem dar ênfase ao rigor técnico. Ao contrário de filmes como “2001: Uma Odisseia no Espaço” (1968), referência clássica da “hard science fiction”, “Nada” se aproxima, ao menos tematicamente, de obras como “Her” (2013), em que o pano de fundo tecnológico serve para explorar afetos, memória, solidão, etc. Fiel a essa proposta, o longa começa em ritmo lento, envolto por uma melancolia persistente. Em uma das primeiras sequências, Ana (Bel Kowarick) dirige por uma estrada de terra sinuosa, coberta de poeira e curvas difíceis. O tempo se dilata dentro do carro. Há algo nessa travessia que escapa ao simples deslocamento geográfico, e isso diz muito sobre o filme.
Pouco a pouco, surgem os primeiros sinais de estranhamento. A irmã de Ana, Tereza (Denise Stutz), coloca um prato a mais na mesa, assiste à televisão ao lado de uma presença que não se explica. Os vizinhos relatam visões, enxergam o passado como se ele nunca tivesse ido embora. Uma tal antena, instalada sem origem nem propósito aparente, parece interferir na percepção local, em cada um de uma forma distinta. Alguns, inclusive, demonstram gratidão pelos mistérios que ela proporciona. Uma mistura de entorpecimento e contentamento. Não se trata de alucinação, tampouco de loucura. É uma forma de conviver com aquilo que, ao menos por dentro, nunca passou.
O filme funciona melhor quando aposta no silêncio. As cenas à mesa, em especial, evidenciam, pois o desconforto emerge na pausa entre uma fala e outra, no que permanece suspenso, não dito. Quando o roteiro tenta verbalizar o que a imagem já tornou evidente, perde parte de sua força. Em certos momentos, esse impulso de explicação soa quase novelesco. É o caso da ligação telefônica usada para expor o estado da irmã. Já vimos que ela está doente, que vive isolada, que evita o contato. Dizer isso em voz alta parece mais uma tentativa de conduzir o espectador pela mão, como se o longa duvidasse da própria linguagem.
A introdução da antena funciona como um convite ao fantástico. A presença do objeto, somada aos relatos dos moradores, projeta algo próximo de um episódio de “Além da Imaginação”. Uma vila isolada, algo fora do lugar que ninguém sabe explicar. O cenário se arma, e a construção de atmosfera é eficiente. Mas o filme hesita. Cria o terreno, mas avança pouco sobre ele.
“Nada” tem seus méritos, principalmente quando decide observar sem intervir. O problema é que observa tanto que às vezes esquece de agir. Algumas ideias se perdem antes de ganhar forma. Outras desaparecem no meio do caminho. Mas quando aceita o risco de não dizer tudo, encontra seu ponto de equilíbrio. É no intervalo entre um gesto e outro que ele finalmente diz alguma coisa.