“Reinventando o Prazer”: sem moralismos, longa mira o desejo com humor e leveza | 2025

O desejo no cinema costuma ser enquadrado por normas que o justificam ou condenam. Quando aparece “fora da ordem”, muitas vezes é reduzido a lição de moral. Há, no entanto, obras que subvertem essa lógica, e “Reinventando o prazer”, novo longa de Caroline Vignal, escolhe um registro mais leve como caminho.
A diretora evita transformar sua protagonista em alvo de sermão e prefere seguir de perto seu despertar, registrando como ela reencontra vitalidade em meio ao marasmo conjugal. Iris (Laure Calamy) leva uma vida aparentemente ordenada, mas sente a distância afetiva do marido minar pouco a pouco o equilíbrio da relação. A descoberta dos aplicativos de encontros funciona como gatilho para um renascimento, trazendo de volta a sensação de ser notada e desejada.
O filme tem mérito por filmar esse processo sem moralismo e por colocar em primeiro plano uma mulher que não abre mão do próprio desejo. Suas limitações narrativas, porém, aparecem cedo. A comicidade se apoia em repetições que funcionam até certo ponto, como o celular que insiste em vibrar nas situações mais banais, mas logo o efeito se esgota e a piada vira ruído. Os encontros são mostrados como esquetes rápidas, privilegiando o constrangimento cômico, enquanto o casamento permanece em segundo plano, sem que o roteiro se arrisque em explorar suas tensões de maneira mais frontal. Nesse movimento, a proposta de crítica social perde fôlego, já que a insistência em repetir situações semelhantes, sem variação de tom ou aprofundamento, transforma o gesto inicial de transgressão em algo previsível. O que poderia ser um comentário ácido sobre o vazio da rotina conjugal acaba se resumindo a uma sucessão de gags que não avançam a reflexão.
Também chama atenção que, para um filme que trata do prazer, a encenação conduza a sexualidade com o mesmo asseio de um manual de boas maneiras. O corpo não transpira nem se entrega, enquadrado em gestos limpos e coreografados como se fossem feitos para o horário nobre da TV aberta. Aqui mora a contradição: o discurso clama por emancipação, mas o olhar filma com a reverência de quem teme profanar algo sagrado.
O grande destaque é Laure Calamy, cuja presença sustenta o filme do início ao fim. É ela quem injeta intensidade em uma trama que por vezes se acomoda em repetições e soluções fáceis. Ainda assim, “Reinventando o prazer” encontra relevância ao colocar na comédia uma personagem feminina que reivindica para si a vivência do desejo sem se submeter a julgamentos. O resultado está longe de ser uma reinvenção, mas, mesmo conduzido com contradições e certa timidez estética, o filme ganha valor ao inscrever na tela um debate atual e relevante.