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“Moneyboys”: Longa discute emancipação financeira e consumo a partir da rotina de garotos de programa taiwaneses | 2024

“Quem não se vende para ganhar dinheiro? Não estamos todos vendendo nossos corpos de um jeito ou de outro?”

Não chega a ser um segredo de Estado a relação desgastada entre China e Taiwan. Desde de 1949, a divisão entre a chamada República Popular da China, continental regida pelo socialismo de Mao Tse Tung, e outra insular com um governo autônomo apoiado pelos EUA, tem gerado nas últimas sete décadas inúmeros conflitos. Em 2023, as divergências sobre o futuro político da ilha voltaram à baila e os ânimos mais uma vez se acirraram. E, curiosamente, coube a um diretor nascido em território chinês – hoje radicado na Áustria – contar uma história sobre independência econômica protagonizada por jovens taiwaneses.

Em “Moneyboys”, somos apresentados a Fei, um rapaz que sai da pequena aldeia onde vivia e que passa a trabalhar como garoto de programa. Já na cidade, ele se apaixona por Xiaolai, que também faz parte de uma extensa rede de prostituição. Tudo muda quando um cliente violento entra em cena, gerando situações cujas consequências vão afastar os jovens por um longo período e fazendo com que Fei, carregado de frustração e culpa, se veja obrigado a retornar ao povoado onde nasceu. Lá, além de todo o rancor de uma família que aceita seu dinheiro mas não sua presença tida como indigna, ele vai encontrar uma chance de recomeço nas interações com o ambicioso Long, alguém disposto a fazer o que for preciso para não ter o mesmo destino de labuta pesada e pobreza que os demais da região.

Como uma produção que equaciona diversas origens, entre elas europeias e asiáticas, “Moneyboys” parece saber exatamente os aspectos de linguagem audiovisual que mais agradam ao público, especialmente aquele frequente em festivais, tanto do ocidente quanto do oriente. Há uma clara influência de grandes nomes do cinema taiwanês como Hou Hsiao Hsien e Edward Yang, mas sob um tipo de controle estilístico que possa conferir ao longa uma aceitação comercial mais ampla. São observáveis aqueles já característicos planos longos e abertos, carregados de informação, porém, alternados com outros mais fechados e “limpos”, muitos deles no interior de apartamentos em que a sobriedade dos cenários transparece.

A forma como a fotografia ilumina as cenas também aponta para a coalizão entre uma estética na qual o neon das boates, banhadas de verde e vermelho, invoca uma atmosfera inebriante nos momentos em que os rapazes estão em serviço, consumindo e sendo consumidos. Em contrapartida, ao virar seu olhar para os rincões daquele território ou para os cantos menos glamourizados dos espaços urbanos, a opção é por uma luz com aspecto mais seco e realista, remetendo, por vezes, a obras de outro mestre, só que do cinema chinês: Jia Zhangke.

Nesse amálgama de maneiras diversas de se fazer cinema, C.B. Yi realiza uma obra que carece de personalidade. Excessivamente limpo para o submundo que retrata, talvez higienizado – frio, por vezes – em demasia para ser mais palatável em determinados circuitos, “Moneyboys” perde a chance de alçar voos maiores, sob o viés temático e até relativo à própria linguagem, ainda mais tendo-se em vista tudo aquilo que ele poderia representar como metáfora para o desejo, individual ou coletivo, de emancipação.

Alan Ferreira

Professor, apaixonado por narrativas e poemas, que se converteu ainda na pré-adolescência à cinefilia, quando percebeu que havia prendido a respiração ao ver um ônibus voando em “Velocidade Máxima”. Criou o @depoisdaquelefilme para dar vazão aos espantos de cada sessão e compartilhá-los com quem se interessar.

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