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“Moana 2”: Animação amplia horizontes com didatismo simplista e acabamento de alto nível | 2024

Irmãzinha!

Qual é o público alvo dos filmes mais recentes lançados pela Disney? Estive me questionando, algumas semanas antes de “Moana 2” chegar aos cinemas, se estaríamos testemunhando atualmente o declínio ou o ressurgimento de um império intelectual no ramo das animações, com filmes que encantam tanto baixinhos quanto grandões e carregam mensagens poderosas que ecoam por décadas através das gerações. É inegável que produções originais recentes tenham sido, em sua maioria, mal aceitas pelo público tanto quanto pela crítica. “Mundo Estranho” e “Wish” foram decepcionantes de diversas formas, e depois de uma nítida queda na qualidade e na recepção tanto dos filmes Disney quanto os da queridinha Pixar, a direção comercial da casa do Mickey decidiu apelar para continuações. Todos os filmes Disney notórios de cinema e streaming em 2024 foram sequências de títulos já estabelecidos, e isso é um sinal e tanto sobre a como o mercado vai se comportar no futuro próximo.

“Moana 2” se faz, no miolo da indefinição sobre os caminhos a serem seguidos, como um paliativo de um problema que ele não tem nem de longe capacidade para abarcar. Vai resolver alguma coisa efetivamente? Não, mas garante o necessário a curto prazo. Em outras palavras, fará milhões de dólares para os cofres do estúdio mesmo sem ser memorável ou vastamente premiado. É exatamente como um remédio para dor durante uma fase de dengue ou pneumonia; e um remédio genérico, ainda que não resolva nada, pelo menos ameniza os sintomas da má fase. Genéricos, como bem sabemos, são réplicas baratas das fórmulas originais – e é exatamente isso o que “Moana 2” é. A questão é: há algum problema nisso? A resposta que dou a mim mesmo, em favor da apreciação do filme como o mero produto mercadológico que ele é, é não. Este aqui, ao contrário de “Meu Malvado Favorito 4”, ainda tem alguma substância que o torne minimamente interessante aos adultos e/ou àqueles que assistiram ao primeiro filme. É um caça-níquel assumido, mas não uma pataquada estapafúrdia como o último filme da Illumination. Tudo bem ser só um produto, desde que seja um produto bem feito – e isso “Moana 2” o é.

Um dos maiores méritos dos filmes Disney está na constante construção emocional que cadencia tramas simples até o culminar de uma catarse lacrimejante involuntária. Em seu segundo filme homônimo, Moana é apresentada desde o primeiro instante com tons heroicos e corajosos, e o filme insiste em retratá-la de tal maneira em sua quase totalidade. Não há grandes dúvidas ou dilemas em sua jornada, e tudo é simplificado de forma quase maniqueísta e sem grandes profundidades. Mudam alguns aspectos, mas a base é a mesma. Contudo, dessa vez os apelos para a tal “catarse lacrimejante” são muito mais honestos e condizentes do que no primeiro filme ou nos dois “Frozen” lançados até agora. Se há lacrimejar ou arrepio, há motivo para isso. Não se sente tapeado como naqueles ares de grandeza que os outros filmes fingiram ter, onde essas sensações eram um reflexo não do texto, mas de manipulações de trilha e renderização para criar o “momentum” quase apoteótico de seus protagonistas.

Moana amadurece, seu mundo cresce e as composições melhoram, embora muitos questionem isso por não ter canções-chiclete aqui e ali. Bem, pelo menos não rimaram a palavra ilha com a palavra ilha, dessa vez. Confesso que não gosto do primeiro filme, seja pela mensagem controversa de justificação do mal (sei que parece puritano afirmar isso, mas outros realizadores têm se atentado para essa preocupação) ou pela simples falta de pudores da protagonista que pode, na visão de algumas crianças, reforçar comportamentos imprudentes perante o oceano ou desrespeitar as autoridades parentais que querem protegê-las e estabelecem regras de segurança. Se no filme ela salva a Aldeia através do enfrentamento e da desobediência, na vida real existem riscos reais de morte se o filme for interpretado ao pé da letra. E olhe só!, crianças interpretam filmes ao pé da letra, não é mesmo? Bom, este segundo filme, pelo menos, não tem esses mesmos problemas.

Voltando à pergunta que abriu o texto, qual será exatamente o público alvo da Disney daqui para frente? A crise identitária de Hollywood, que deveria fazer a indústria se reinventar e arriscar mais produções originais que valham o valor cada vez maior dos ingressos, está na verdade levando os acionistas a recorrerem a riscos menores e optarem por “jogar no seguro”. Seguindo parcialmente a receita da Illumination, colocaram aqui como ingrediente extra uma Irmãzinha super fofa só para vender mochila e dar mais motivação à Moana. A questão é que aqui, pelo menos, a personagem nitidamente feita pra vender bonecos pelo excesso de fofura tem alguma relevância real na trama e não ofende o intelecto de ninguém com sua existência. Assim sendo, o filme inteiro é só um capítulo para “não deixar o samba morrer” e a marca ficar esquecida; tanto é que o filme foi anunciado apenas dez meses antes de sua estreia, em meio à expectativa por um live action igualmente desnecessário, mas que certamente fará um mar de dinheiro. Pelo que parece, o público alvo é o saudosismo, mesmo através de obras que estão longe de ser merecedoras desse apreço.

Vinícius Martins

Cinéfilo, colecionador, leitor, escritor, futuro diretor de cinema, chocólatra, fã de literatura inglesa, viciado em trilhas sonoras e defensor assíduo de que foi Han Solo quem atirou primeiro.

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