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“Longlegs-Vínculo Mortal”: Fenômeno cult com Nicolas Cage evoca filmes de serial killer com pitadas de ocultismo | 2024

O gênero de terror, ao longo das últimas décadas, nunca saiu de moda. Entra ano e sai ano, sempre há alguma nova produção estreando nas salas de cinema que se remete às narrativas repetitivas que ora buscam surfar em histórias de exorcismo, terror gory ou o subgênero “found footage”. Este último, teve sua grande gênesis no fenômeno mundial de 1999, “A Bruxa de Blair”, que nasceu sob um hype estupendo na internet e através do boca a boca alavancou uma obra que teria custado 60.000 dólares para um lucro mundial de quase 250 milhões de dólares.

O fenômeno viria a se repetir, dentro desta categoria de filmes, com “Atividade Paranormal” (2007), que teve um orçamento ainda mais modesto de 15 mil dólares e conseguiu arrecadar cerca de 193 milhões de dólares mundialmente. Tudo isso reflete o poder que uma boa sacada narrativa bem realizada e divulgada de maneira estratégica pode jogar filmes baratos, com boas histórias e com uma boa dose de suspense nas alturas. “Longlegs – Vínculo Mortal”, que estreia essa semana no Brasil, não compartilha do mesmo subgênero de “found footage”, mas sabe beber do hype e do poder que uma boa campanha de marketing pode fazer por um filme de baixo orçamento. A começar que a produtora NEON, decidiu ocultar o visual final da estrela do filme, Nicolas Cage, de qualquer peça publicitária (cartaz, teasers e trailers…). No teaser do filme, eles inclusive brincam com a reação da atriz protagonista, Maika Monroe, vendo Cage caracterizado pela primeira vez como o Serial Killer e seus batimentos cardíacos extremamente alterados.

Na trama, Nic Cage interpreta a figura que dá o título ao filme, Longlegs, um homem completamente deformado por cirurgias plásticas e de comportamento errático e descompassado em relação ao convívio social. Utilizando próteses pesadas, Nic Cage está irreconhecível e faz um mergulho assustador na caracterização deste outsider, que vive isolado da comunidade de Oregon. Acompanhamos o ponto de vista narrativo de uma Agente do FBI chamada Lee Harker (Maika Monroe). Harker tem aparentemente alguns dons de clarividência, podendo através de seu feeling aguçado por exemplo identificar o paradeiro de um homicida apenas observando as casas de um bairro pacato. Este dom é logo percebido pelo Chefe do FBI local, Agente Carter (Blair Underwood), que a escala para ajudar a resolver o caso de mortes recorrentes de famílias inteiras massacradas naquela comunidade. Nas cenas do crime, sempre há uma carta deixada no local com uma mensagem de criptografia e assinada por Longlegs.

O primeiro terço do filme tem uma clara inspiração em “O Silêncio dos inocentes” (1991), não só no formato visual, mas também na semelhança do eixo narrativo de uma mulher ganhar destaque na corporação do FBI predominantemente masculina e com talentos próprios que a fazem destacar na sua missão de desvendar crimes bárbaros. Enquanto no filme de Jonathan Demme, Jodie Foster interpretava uma Agente do FBI, Clarice Starling, com perfil destemido, um passado sombrio e inteligência notável, aqui Maika Monroe constrói uma personagem introvertida, de poucas palavras e praticamente catatônica ao se expressar em seu tom monocórdio, quase como se estivesse constantemente dopada.

A Agente Lee Harker leva uma vida solitária numa cabine na floresta e reserva seus dias e noites praticamente todo ao ofício obsessivo de tentar decodificar as mensagens deixadas nas cenas de crimes cometidos por Longlegs. Há uma clara intenção do diretor, Oz Perkins, de homenagear a estética e conceito de “O Silêncio dos Inocentes”, mas também de outras pérolas do gênero como “Seven: Os Sete Crimes Capitais” (1995) ou “Zodíaco” (2007). Para quem não sabe, Oz Perkins é filho de Anthony Perkins, o Norman Bates do Clássico Hitchcockiano “Psicose” (1960). Esta curiosa hereditariedade sombria que Oz Perkins tem, está bastante impressa em sua filmografia e atinge o ápice em “Longlegs”. O diretor consegue criar um clima claustrofóbico e perturbador durante toda a duração do longa. Seus planos abertos com Monroe no centro da tela e a forma como ele opta por filmar sempre ocultando a face de Longleg de seu público para só escancarar a mesma numa cena memorável de interrogatório do FBI é de uma precisão excepcional.

Outras peças do quebra cabeça vão se juntando quando entra em cena o contexto familiar da Agente Lee, ela é filha única e recebe ligações telefônicas frequentes de sua mãe, Ruth. A mãe é introduzida inicialmente como o único contato afetivo que Lee tem através destas ligações que são desconcertantes e que refletem um certo fanatismo religioso latente. A relação ganha mais contexto quando Lee vai visitar sua antiga casa e é revelada a condição em que sua mãe vive. Ruth é interpretada pela atriz Alicia Witt, atriz que também foi musa de terror teen dos anos 90 no subestimado “Lenda Urbana” (1998).

“Longlegs” acaba tomando outros contornos quando uma boneca ultrarrealista é encontrada na cena do crime de uma das famílias. A partir daí, o filme adquire outras liberdades dando espaço para elementos sobrenaturais que comprometem de certa forma a coerência do roteiro até ali. Esses componentes que acessam ocultismo e conexões satânicas, acabam exigindo bastante do público que precisa comprar uma premissa não realista e que definitivamente gerará debates acalorados pós sessão de cinema. Já há intensa atividade no You Tube de vídeos se proliferando explicando o final do filme.

É uma pena que Nic Cage ganha pouco tempo de tela na versão final do filme. Cada aparição dele rende cenas ao mesmo tempo assustadoras como também impactantes, gerando mais curiosidade em entender o background do qual aquela figura se origina. Talvez estas passagens tenham sido cortadas e rechearão cenas deletadas de algum futuro BluRay de um Director´s Cut.

Interessante notar como o filme prende a atenção do público. Na sala de cinema em que assisti ao Longa nos Estados Unidos, o silêncio era sepulcral e o público claramente estava conectado com a narrativa durante sua uma hora e quarenta minutos de projeção. “Longlegs” é prato cheio para quem aprecia cinema e identifica referências do terror e suspense na tela. Oz Perkins fez o dever de casa e junto com “Entrevista com o Demônio” nos entrega uma das melhores obras do gênero em 2024.

Marcello Azolino

Advogado brasiliense, cinéfilo e Profissional da indústria farmacêutica que habita São Paulo há 8 anos. Criou em 2021 a página @pilulasdecinema para dar voz ao crítico de cinema e escritor adormecido nele. Seus outros hobbies incluem viagens pelo mundo, escrever roteiros e curtir bandas dos anos 80 como Tears For fears, Duran Duran e Simply Red.

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