Festival do Rio 2024 : “The Outrun”, de Nora Fingscheidt | 2024
Eu não sou feliz sóbria...
“The Outrun”, um dos grandes destaques internacionais do Festival do Rio esse ano é também uma das promessas na temporada de premiações, cujo burburinho dá conta de uma possível indicação na categoria de Melhor Atriz para a talentosa Saoirse Ronan (“Ammonite” -2020). De fato a cineasta e roteirista Nora Fingscheidt (do incrível “Transtorno Explosivo”– 2019), extrai todo o potencial de sua protagonista, e o resultado é uma obra com muita força, que vem sobretudo dessa personagem que está buscando se reconectar com ela mesma, ainda que não se conecte com o mundo à sua volta.
Baseado em uma história real, o longa acompanha a jornada de Rona (Saoirse Ronan), de 29 anos, que após uma década em Londres, volta para casa nas Ilhas Órcades. Sóbria, mas solitária, ela tenta apagar da memória os acontecimentos que a levaram a fazer esta viagem de recuperação. Lentamente, os mistérios daquele lugar vão invadindo o seu mundo interior e, um dia de cada vez, Rona encontra esperança e autoconfiança cercada pelos ventos fortes e pelo mar gelado daquele lugar.
“The Outrun” é uma viagem introspectiva e melancólica ao interior dessa jovem mulher que caminha pelos lugares sem se sentir pertencida à lugar algum. Mas ainda que lance mão de muita contemplação e divagações da personagem sobre sua condição, Fingscheidt consegue imprimir potência pela inserção de imagens espetaculares e planos abertos que ganham força através de uma trilha sonora crescente que toma a sala e nos leva para dentro de Rona, para o íntimo dessa personagem, com todas as suas dúvidas, medos, ansiedades e até lampejos de esperança. Acompanhar essa saga se torna uma tarefa um tanto desafiadora, já que a montagem opta por contar a história de forma não linear, o que pode gerar alguma confusão aos que preferem tramas com condução cronológica.
Alguns vão dizer que “The Outrun” explora temas já vistos e revistos : a redenção, o regresso a si próprio e a luta contra o vício. É fato que esses temas têm sido amplamente tratados no cinema, e o filme não se desvencilha de algumas convenções. A história da sobriedade, com os seus altos e baixos, é por vezes um tanto previsível. No entanto, a sinceridade com que estes temas são abordados, aliado ao excepcional desempenho de Saoirse Ronan e à direção imersiva de Fingscheidt, acaba por transcender estas potenciais redundâncias para proporcionar um filme que ressoa no nosso emocional. É claramente perceptível que a realizadora alemã é uma notável regente, que tem total domínio da linguagem que escolheu para contar a história de Rona.