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“Bad Boys: Até o Fim”: Ação efervescente constitui o mea culpa ideal para o retorno de Will Smith l 2024

Eu não posso morrer

Desde a criação de John Wick, o habilidoso assassino de aluguel que dominou a cultura popular, pouco foi reinventado no cinema de ação. Os filmes, antes dele, eram mais criativos ou no mínimo mais ousados, se arriscando em alternâncias de ritmo sutis e com tramas mais simples em uma enxurrada de balas e explosões. “Não se faz mais filmes como antigamente”, diz o meu eu saudosista, e assistindo “Bad Boys: Até o Fim” percebi ainda mais o quanto filmes assim estão fazendo falta no cinema atual.

É difícil estabelecer em que momento o gênero abdicou da galhofa. Mesclar ação e comédia sempre rendeu bons públicos, mas desde os tempos de Jason Bourne a dita “ação séria” tem dominado os circuitos; até que chegou o Baba Yaga para enterrar de vez aquela vertente de filmes episódicos descompromissados. Quando os dois primeiros filmes da franquia “Bad Boys” foram lançados, lá nos longínquos anos de 1995 e 2003, o mundo era outro. A direção pirotécnica de Michael Bay era a tendência, e ver Martin Lawrence e Will Smith em um filme de pancadaria policial, dois astros da comédia, logo se tornou um fenômeno.

A magia deste quarto capítulo da saga de Marcus e Mike é a sua capacidade de promover quase uma viagem no tempo ao resgatar aquele tipo de filme e contextualizá-lo a um mundo mais moderno. Apesar da troca no cargo de direção desde o filme anterior (“Bad Boys Para Sempre”, 2020), o estilo michaelbayano (se essa palavra não existia, agora existe) permanece na dinâmica que Adil El Arbi e Bilall Fallah adotaram para seus filmes. Câmeras inquietas e explosões exageradas caminham agora de mãos dadas a drones e videogames em primeira pessoa. É um encontro curioso de anos 1990 e 2020 que faz crescer a esperança de voltar a ver mais daquele cinema ressurgindo.

A abordagem dos filmes da franquia, apesar de cômicas, sempre tiveram um teor crítico. Dois negros, que usualmente seriam o alvo das ações policiais (isso até hoje, vide as polêmicas estadunidenses que periodicamente estampam as capas de jornais mundo afora), agora assumindo o cargo de oficiais da polícia. “Bad Boys” remodelou o imaginário americano acerca de quem podia ser o que, e se a franquia é relevante e faz sucesso até a atualidade isso se deve a esse engajamento sociopolítico. O novo filme não só sabe disso como também brinca, de forma espalhafatosa, com os argumentos raciais que dominam a Internet de forma equivocada.

Mike e Marcus tem que limpar o nome do falecido capitão Howard, e de investigadores viram investigados. É como se o filme promovesse uma inversão de papéis como recurso narrativo na busca de ambos por justiça, e é aí que se dá uma das mais geniais jogadas do filme: encerrar a política de cancelamento a Will Smith após o evento trágico que foi o Oscar de 2022. É como se o cinema fizesse um revide e ao mesmo tempo um mea culpa ao tapa dado por Smith contra Chris Rock, e isso não só melhora a imagem de Smith como também agrega ainda mais valor ao filme – considerando o significado explícito de ter outro comediante negro esbofeteando Will Smith como compensação histórica.

“Bad Boys: Até o Fim” não é uma obra-prima, então não vá ao cinema querendo ver a reinvenção da roda. O filme, na verdade, se propõe justamente a ser o contrário; é um filme nostálgico não por si só, mas por todo o contexto estilístico que ele traz na bagagem. É um filme para ver com a sessão lotada, para dividir a gargalhada, para achar graça do absurdo e esquecer o que viu assim que começam os créditos – como um bom filme pipoca escapista deve ser. E sim, precisamos de mais filmes assim.

Vinícius Martins

Cinéfilo, colecionador, leitor, escritor, futuro diretor de cinema, chocólatra, fã de literatura inglesa, viciado em trilhas sonoras e defensor assíduo de que foi Han Solo quem atirou primeiro.

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