“Back To Black”: Cinebio gourmetizada de Amy Winehouse foca na explosão do álbum que dá nome ao filme | 2024
Recrie todas as merdas que mamãe odeia
Amy Winehouse começou sua caminhada na música numa época em que as Spice Girls eram um raro fenômeno inglês levado ao mundo todo. Até hoje, nem sempre ser um sucesso na Inglaterra representa ser um sucesso mundial, mas Amy, com toda sua personalidade (na música e fora dela) quebrou as barreiras britânicas e estourou nos quatro cantos do planeta. Com uma identidade musical jamais vista, a cantora não aceitava as imposições dos produtores e repetia sempre que nunca deixaria de ser ela mesma. A frase em questão passa a ser um mantra levado bem a sério pela cineasta Sam Taylor-Johnson (“Cinquenta Tons de Cinza”– 2015) na cinebio desse meteoro, que apesar de ter lançado dois discos em vida se tornou uma das artistas recentes mais relevantes de todos os tempos.
A cinebiografia acompanha a breve carreira de Amy Winehouse (Marisa Abela), que morreu precocemente aos 27 anos de idade por intoxicação alcoólica, em 2011. Abraçando o fim da adolescência até a fase adulta, sua curta carreira profissional é apresentada, desde os seus primeiros dias em Camden Town, bairro que dita moda e cultura na cidade de Londres, até a produção de seu inovador álbum, Back to Black, que serviu como um grande impulso para a fama global de Amy além de dar a intérprete 63 indicações e 27 vitórias entre 2007 e 2009 . A história, que segundo a diretora é contada através dos olhos da cantora, explora as muitas camadas da artista, além de seu relacionamento amoroso tumultuado com Blake (Jack O’Connell), que era amplamente explorado pelos tabloides e pelas aves de rapina chamadas de paparazzi.
“Back To Black” está muito longe de ser uma cinebio à altura dessa figura incompreendida. Meu maior medo desde o anúncio do projeto foi ver o nome de Abela cotada para o papel. Será que uma atriz que tem poucos trabalhos no curriculum e que até então não tinha feito nada de relevante seria capaz de encarar um personagem de tamanho impacto na cultura pop? Contudo, ainda que falte cancha à atriz para uma persona tão forte, Abela me surpreendeu em diversos momentos, tendo o grande ponto à seu favor o usa da própria voz para defender as canções eternizadas pela cantora. Muito diferente do que aconteceu com “I Wanna Dance With Somebody – A História de Whitney Houston”, cinebio onde a atriz Naomi Ackie foi duramente criticada por usar o artificio da dublagem para encarar o papel.
Ainda que tenhamos no projeto uma atriz que canta, isso não é suficiente para construir uma história crível e interessante da diva, que apresenta várias falhas em sua estrutura ao ostentar o maior pecado que alguém poderia cometer ao encarar a empreitada de conduzir uma cinebiografia: o de ‘limpar’ as imagens, tanto da personalidade alvo do projeto quanto daqueles ligados diretamente à ela. Essa gourmetização de pessoas e de episódios vividos por Amy, pra mim, é o Calcanhar de Aquiles da produção, onde Taylor-Johnson escolhe tratar muitos assuntos de maneira superficial, desvirtuando, como por exemplo, até mesmo as conexões da cantora com o pai, Mitch Winehouse, vivido com competência por Eddie Marsan.
Porém, nem tudo é perdido em “Back To Black”, é preciso deixar registrado o amparo que a protagonista recebe de todo um elenco coadjuvante de peso, como a incrível Lesley Manville, que vive Cynthia Winehouse, a avó de Amy, ou mesmo Jack O’Connell, que encarna o grande amor da vida da cantora, homem esse que apresentou as drogas pesadas que a fizeram sucumbir. É uma grande pena que um ícone tão marcante e único seja retratado por um projeto tão mediano. Contudo, tenho certeza que boa parte do público sairá satisfeito com o pouco que Sam Taylor-Johnson entrega nesse trabalho. Pelo menos é esse o feedback que recebi de muitos ao fim da sessão.