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“As Polacas”: Valentina Herszage brilha em drama inspirado em uma triste história real | 2024

Como muitos sabem, para escapar da Guerra,  muitos judeus e poloneses se refugiaram no Brasil para encontrar alguma paz em meio às barbáries daquele momento. Mas ao contrário do que muitas mulheres judias achavam, a chegada no Brasil iria representar um novo calvário. Para sobreviver, deveriam se prostituir.

“Em uma guerra, o primeiro corpo a ser transformado em moeda de troca e a sofrer violência sexual é o feminino”, lamentou a produtora Iafa Britz em uma de suas entrevistas durante o lançamento de “As Polacas”, que chegou recentemente ao circuito. De origem judaica e descendência polonesa, Iafa se viu com a responsabilidade de trazer o assunto à tona, já que a história em geral promove o apagamento de muitos tabus, e esse, até para sua família, era um deles.

Na trama estamos em 1917. Rebeca (Valentina Herszage), para fugir da fome e da guerra na Polônia chega ao Brasil para reencontrar o marido e iniciar uma nova vida. No Rio de Janeiro, ela descobre que seu marido faleceu e acaba refém de uma grande rede de prostituição e tráfico de mulheres, chefiada pelo impiedoso Tzvi (Caco Ciocler). Sem saída e com um filho pra criar sozinha, Rebeca passa por cima de suas próprias crenças e valores e, na casa onde seu corpo era moeda de troca, ela então encontra aliadas que vivem o mesmo drama.

O cineasta João Jardim (“Getúlio”-2014) segue o rastro da angústia dessas mulheres traficadas e relegadas ao desprezo, e que quando mortas eram lançadas numa vala. O filme também aborda, ainda que muito superficialmente esse dilema, já que essas mulheres forçadas a se prostituir também lutavam pelo direito ao Tahara, um ritual da cultura judaica onde o funeral consiste em um banho cuidadoso com água pura e feito cuidadosamente por um grupo, enquanto preces são recitadas pedindo perdão em nome do falecido por possíveis pecados cometidos em vida. Assim, descobrimos também que foi pelo movimento dessas mulheres que o antigo Cemitério Israelita de Inhaúma, fundado em 1906, foi o local onde muitas delas puderam ganhar um enterro digno.

Enquanto filme histórico, o projeto que é inspirado em dois livros, La polaca (2003), de Myrtha Schalom, e El infierno prometido – Uma prostituta de la Zwi Migdal (2006), de Elsa Drucaroff, tem seu valor. “As Polacas” tem uma produção caprichada e é imprescindível vermos nossas deficiências enquanto sociedade nas telas de cinema. Porém, enquanto entretenimento, o filme deixa passar a chance de ser mais ousado. Profundidade e paixão, no sentido mais amplo da palavra, surge já no terceiro ato, que é quando o lado romanceado do longa ganha força, e uma pena que fique um pouco tarde para exemplificar de maneira mais literal toda a maldade pela qual essas mulheres passaram ao chegar no Brasil. Em contrapartida, apesar de achar que tudo é muito limpo e traduz pouco a realidade dessas mulheres, é revigorante ver o quanto Valentina Herszage encara com coragem esse protagonismo, uma atriz jovem e já com tantos trabalhos de expressão no cinema brasileiro. O filme peca em detalhes, inclusive no tom maniqueísta empregado aos algozes na trama, mas há que se dar o real valor a entrega de grande parte do elenco, sobretudo Valentina, que está com toda certeza em um de seus melhores momentos na carreira.

Rogério Machado

Designer e cinéfilo de plantão. Amante da arte e da expressão. Defensor das boas causas e do amor acima de tudo. Penso e vivo cinema 24 horas por dia. Fundador do Papo de Cinemateca e viciado em amendoim.

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