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“A Estrela Cadente”: Da alegria à melancolia, longa belga proporciona uma divertida comédia nada usual | 2024

No cinema, os gêneros de terror e comédia destacam-se pela marcante diversidade de subgêneros. A comédia, em particular, abrange um espectro que vai desde sátiras refinadas até formas de humor mais diretas e escrachadas. Tanto o riso quanto o medo são subjetivos, variando não só entre indivíduos, mas também de acordo com diferentes contextos culturais. O humor britânico é conhecido por seu sarcasmo ácido, exemplificado por grupos icônicos como Monty Python, enquanto a comédia brasileira se destaca pela expressividade e gestualidade, frequentemente inclinando-se para o deboche.

Em “A Estrela Cadente”, a comédia evoca o estilo dos trabalhos de Jacques Tati, aclamado cineasta francês que atuou entre os anos 40 e 70, e de Aki Kaurismäki, distinto diretor finlandês ainda em atividade. De forma semelhante, a dupla belga Dominique Abel e Fiona Gordon, parceiros dentro e fora das telas, conduzem de maneira fluente e jocosa uma narrativa que tece humor através de uma série de tragédias.

Na trama, Boris (Dominique Abel), um ex-ativista que passou 35 anos vivendo sob disfarce, vê ressurgir traumas do passado quando um estranho armado e sedento por vingança entra em seu bar.

O filme começa com dois arcos narrativos distintos que se desenrolam simultaneamente. De um lado, temos Boris, que percebe em Dom uma semelhança física crucial para seu plano de fuga. Paralelamente, na mesma região, a detetive particular Fiona lida com o luto de uma perda trágica, enquanto busca entender o afastamento do marido. Aos poucos esses arcos vão se entrelaçando até se tornarem um só. A capacidade de síntese dos diretores Dominique e Fiona, que também atuam como protagonistas, impressiona uma vez que o longa tem duração de pouco mais de uma hora e meia, e a história não é exatamente óbvia. As respostas tão pouco são entregues de forma expositiva, exceto por um breve momento próximo a conclusão.

O elenco de apoio é igualmente bom. Kayoko, a sedutora companheira de Boris, faz lembrar as icônicas femme fatales do cinema noir. Tim, o porteiro de aparência imponente e feições reservadas, surpreende ao revelar uma doçura que contrasta com sua estatura. Já Georges, o motorista de ambulância, é a típica caricatura do “vilão” atrapalhado, sempre em luta com seu braço mecânico fora de controle que o impede de dar fim a sua vingança.

O filme é marcado por uma constante subversão de expectativas, o que inicialmente cativa, mas pode se tornar um calcanhar de Aquiles. Essa recorrente inversão pode, ironicamente, fazer com que o público antecipe as surpresas, diminuindo o impacto das reviravoltas.

O humor no filme possui um caráter bastante específico, mas isso não se deve a complexidades ou hermetismo. Ao contrário, o filme é transparente em suas intenções, evitando qualquer pretensão de ser excessivamente intelectualizado ou poeticamente lúdico. A questão é que o estilo de comédia adotado distingue-se significativamente do humor tradicionalmente apreciado em culturas como a brasileira ou a americana, que são mais familiares ao grande público. Porém, assim como em tudo na vida, uma mente aberta pode gerar bons frutos, e neste caso, boas risadas.

Rafa Ferraz

Engenheiro de profissão e cinéfilo de nascimento. Apaixonado por literatura e filosofia, criei o perfil ‘Isso Não é Uma Critica’ para compartilhar esse sentimento maravilhoso que é pensar o cinema e tudo que ele proporciona.

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