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“A Hora do Mal”: longa trabalha com múltiplas perspectivas, fragmenta o mistério e conduz a tensão até o limite | 2025

“A Hora do Mal” parte de uma premissa das mais instigantes. Em uma noite aparentemente comum, uma pequena cidade no subúrbio tem sua rotina pacata interrompida quando, ao mesmo tempo, dezessete crianças de uma mesma sala de aula se levantam de suas camas e correm porta afora, desaparecendo na escuridão. Ao amanhecer, apenas um aluno permanecia, e o que antes parecia um ambiente seguro passou a carregar a tensão de um mistério coletivo. É a partir dessa fissura na normalidade que o filme constrói sua atmosfera, conduzindo o espectador por uma sucessão de eventos onde o inexplicável se mistura à inquietação crescente.

Zach Cregger, que já havia mostrado a que veio com o ótimo “Noites Brutais” (2022) e construiu uma carreira na comédia antes de se dedicar à direção de longas, alinha aqui o timing cômico ao terror, criando um híbrido raro no gênero. Não se trata de inserir piadas pura e simplesmente, mas de aplicar o ritmo e a lógica da comédia na construção da tensão. O resultado é uma atmosfera em que a estranheza se intensifica e os picos de violência e medo surgem de forma ainda mais abrupta. Ao unir duas linguagens que exigem controle preciso, Cregger mantém o público suspenso entre o riso nervoso e o choque seco do horror.

O enigma que move a trama não alcança o mesmo nível de eficácia. A construção do quebra-cabeça insinua algo mais complexo do que o que se revela e, quando a resposta chega, parece uma fruta que caiu do pé cedo demais. A estrutura em capítulos, centrada em personagens específicos, funciona para criar vínculo mínimo com cada trajetória. Não aprofunda, mas é eficiente o bastante para que as perdas sejam sentidas.

A ambientação suburbana opera como inversão de expectativa. O espaço que deveria garantir sossego se torna palco de desorientação e medo, e a cidade pacata revela fendas que estavam lá o tempo todo. A vilã encarna um arquétipo reconhecível do gênero. Não há grande reinvenção no antagonismo, mas há clareza na ameaça e um atalho dramático que mantém o foco no efeito que a violência produz nos demais.

“A Hora do Mal” se apoia no choque entre registros. O riso nervoso que irrompe quando a tensão aperta, a violência que corta a rotina, o realismo imperfeito de personagens falhos em colisão com uma lógica sobrenatural que não pede licença. O mistério não entrega o impacto que promete, porém a experiência se sustenta na atmosfera, no controle do ritmo e na maneira como cada segmento empurra o espectador para um desconforto persistente. Fica menos a lembrança do susto isolado e mais a impressão incômoda de que, desde o começo, algo estava fora do lugar.

Rafa Ferraz

Engenheiro de profissão e cinéfilo de nascimento. Apaixonado por literatura e filosofia, criei o perfil ‘Isso Não é Uma Critica’ para compartilhar esse sentimento maravilhoso que é pensar o cinema e tudo que ele proporciona.

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