“Lee”: cinebio revela o destemor de uma mulher que fez do fotojornalismo a grande missão de sua vida | 2025

Em tempos de guerra, quando forças autoritárias ameaçam valores comuns conquistados a duras penas, é inevitável que sacrifícios individuais sejam exigidos não só daqueles que são enviados aos campos de batalha. Tão fundamental quanto as infantarias que vão à luta é o esforço de guerra doméstico. Durante a Segunda Guerra Mundial, o trabalho de homens e mulheres nas indústrias, nas fábricas de tecidos e nos serviços de comunicação foi primordial para êxito dos aliados no tetro de operações nos campos da Europa.
Lee Miller, que no preludio da guerra era uma ex-modelo americana da Revista Vogue, gozava uma vida abastada no litoral da França, cercada de amigos, bons vinhos e boa gastronomia. Apesar de expressarem preocupação com a ascensão de Hitler na Alemanha, a elite pensante relutou em acreditar que aquele lunático tentaria subjugar a Europa aos seus desejos delirantes de dominação. Ao retornar para Londres, Miller encontrou uma realidade de penúria e escassez. Em meio aos rotineiros bombardeios da Luftwaffe que se abatia sobre a cidade, ela tentava buscar um emprego, algo que pudesse fazer a diferença. Como a fotografia sempre esteve presente em sua vida, ele retornou à Revista Vogue para apresentar seu portfólio. Embora tenha havido um relutância inicial, Lee Miller não só conseguiu o emprego, como convenceu a sua chefe a enviá-las às regiões de conflito.
Dirigido por Ellen Kuras,“Lee” é a cinebiografia da famosa fotojornalista que fez relevantes registros fotográficos durante a Segunda Guerra Mundial, capturando o drama vivido pelos soldados nas trincheiras e os horrores dos campos de concentração nazistas. Explorando os percalços enfrentados por Lee Miller até conseguir embarcar para a zona de guerra, o filme retrata as dificuldades enfrentadas por mulheres que decidiram contribuir diretamente com os esforços militares no conflito. Embora inicialmente o roteiro deixe a impressão de que essas dificuldades foram deliberadamente construídas por homens que ocupam posições de poder, esse discurso infantil é rapidamente abandonado com uma bela sequência de Miller fotografando a rotina das mulheres nos acampamentos de campanha.
Mesmo estando absolutamente envolvida com o seu trabalho no front, Miller sempre se viu confrontada pelo dilema de lá permanecer ou ter de voltar para casa e viver ao lado de seu marido. Seu sacrifício por uma causa maior, nos legou o registro documental de uma das maiores atrocidades produzidas pela insensatez humana. Essa escolha, por óbvio, deixou marcas. O que suas lentes presenciaram lhe trouxeram traumas que ela carregou até o final de sua vida.
Kate Wislet empresta todo seu talento para viver a protagonista, entregando uma atuação repleta de dramaticidade. Marion Cotillard, apesar do pequeno papel, também apresenta um trabalho que emociona. Talvez o ponto fraco do longa seja o design de produção; mesmo que o figurino e a reconstituição dos equipamentos utilizados por Milller – a lendária Rolleiflex – estejam muito bem acabados, faltou mais cuidado com as cenas de combate, que mais parecem uma pouco inspirada série de TV. Os diálogos, por vezes excessivamente expositivos, não chegam a incomodar. Esses detalhes, no entanto, não comprometem a produção, que traz à luz a história de uma mulher destemida, que entendeu o seu papel em seu tempo, e fez a diferença.