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“Baby”: Novo filme de Marcelo Caetano insere poesia no caos da cidade de São Paulo | 2024

“Não existe amor em SP ;
Os bares estão cheios de almas tão vazias ;
A ganância vibra, a vaidade excita , Devolva minha vida e morra..”

Esses são apenas alguns trechos da bela canção de Crioulo, muso da nova MPB, que retrata o quão famigerada pode ser a cidade de São Paulo, uma selva de pedra onde o corre é inevitável e cada um se vira como pode, ainda mais entre as classes desprivilegiadas. O novo filme do cineasta mineiro Marcelo Caetano (“Corpo Elétrico”, 2017), premiado na Semana da Crítica do Festival de Cannes 2024, laureando Ricardo Teodoro como Melhor Ator, extrai poesia em meio a fauna vertiginosa e frenética da maior cidade da América Latina.

“Baby” acompanha a história de Wellington (João Pedro Mariano), um jovem que, ao deixar um centro de detenção juvenil, se encontra sem rumo nas ruas de São Paulo – sem contato com os pais, que se mudaram sem deixar notícias- , e sem meios para recomeçar. Em um rolê com os amigos  num cinema pornô, ele conhece Ronaldo (Ricardo Teodoro), um homem mais velho que lhe apresenta novas maneiras de ganhar a vida. Com o passar do tempo, o vínculo entre os dois se transforma em uma paixão marcada por intensos conflitos, alternando entre exploração e cuidado, ciúmes e companheirismo.

O corre do dia a dia e as amizades da rua, que entre pequenos delitos e as danças da cultura Ballroom no transporte público para conseguir o rango do dia, ganham contornos cheios de afeto, têm humanidade e paixão. No meio de tanta crueza, desumanidade e selvageria Caetano insere dois personagens tão iguais e tão distantes um do outro: a ingenuidade de Wellington diante de um mundo pronto para engoli-lo, estranhamente faz coro com a vivência que Ronaldo tem da vida, que trabalha como michê para manter o filho adolescente que tem com Priscila (Ana Flávia Cavalcanti), hoje dividindo a vida com Jana (Bruna Linzmayer). Personagens absolutamente palpáveis, cujo mérito de Caetano é trazer essas pessoas até o público com suas lentes ternas, por vezes inquietas e radiantes, e nos envolver com cada uma delas.

“Baby”, que dividiu o prêmio de Melhor Filme com “Malu” no Festival do Rio 2024, é um conto afetuoso sobre amores possíveis semeados em campos áridos e sem esperança. Marcelo Caetano, de um modo delicado, orgânico e cheio de ritmo, lança um olhar apurado sobre a comunidade gay da cidade de São Paulo: o risco da violência nas ruas, o desejo, a busca por algo que nunca vem, o preconceito, o abandono, a reinvenção. O grande feito de Caetano nesse drama, tão terno quanto cru, é nos levar pra perto desses personagens de um modo tão inevitável que passamos a torcer para que uma virada aconteça. Pode ser que essa virada não venha até o subir dos créditos, assim como o dia a dia de um LGBT, que precisa se reafirmar e se provar diante de uma sociedade maculada pelo preconceito.

Rogério Machado

Designer e cinéfilo de plantão. Amante da arte e da expressão. Defensor das boas causas e do amor acima de tudo. Penso e vivo cinema 24 horas por dia. Fundador do Papo de Cinemateca e viciado em amendoim.

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