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“Herege” : Com grande atuação de Hugh Grant, longa usa religião como mote para embate intenso e provocador | 2024

A versatilidade é uma das qualidades mais valorizadas em atores e atrizes. Quando intérpretes marcados por um gênero específico transitam para áreas completamente diferentes, essa mudança costuma ser recebida com entusiasmo. Jim Carrey, por exemplo, amplamente reconhecido como um dos maiores comediantes de todos os tempos, surpreendeu ao entregar performances dramáticas excepcionais em “O Show de Truman” (1998) e “Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças” (2004). Carrey também se aventurou pelo terror com “Número 23” (2007), embora com resultados menos expressivos. Outro nome que trilhou um caminho semelhante é Adam Sandler, conhecido por suas comédias irreverentes, mas que mostrou força no drama em “Embriagado de Amor” (2002) e “Joias Brutas” (2019). Agora, “Herege” aposta em outro rosto famoso que busca se reinventar. Hugh Grant, figura icônica das comédias românticas dos anos 1990, deixa para trás o charme angelical que o consagrou para assumir um papel desafiador e perturbador.

Na trama, acompanhamos Paxton (Chloe East) e Barnes (Sophie Thatcher), duas jovens missionárias da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, empenhadas em converter a população local à sua fé. Sua mais recente missão as leva até o enigmático Sr. Reed (Hugh Grant), um homem cujo comportamento inquietante e provocador transforma o encontro em algo inesperadamente sombrio e perigoso.

Visualmente, o filme adota uma abordagem simples e funcional. A decupagem segue fielmente as descrições do roteiro, limitando-se a escolhas previsíveis nos enquadramentos. Há, no entanto, momentos de maior ousadia, como sequências em que uma maquete reflete eventos reais ou ângulos de câmera que sugerem dualidade. Apesar de interessantes, essas escolhas não chegam a demonstrar uma verdadeira expressividade visual, parecendo mais uma tentativa de virtuosismo técnico.

O texto, por outro lado, é refinado e bem estruturado. O filme começa com um diálogo entre as duas protagonistas, que revela suas personalidades contrastantes. Embora compartilhem a mesma missão, as diferenças entre elas enriquecem a dinâmica da história. Quando chegam à casa do Sr. Reed, os diálogos ganham intensidade, mas frequentemente pendem para monólogos do antagonista. Ainda assim, o domínio de Hugh Grant nesses momentos não prejudica o engajamento. Pelo contrário, é nesse desequilíbrio que a narrativa se ancora para criar tensão e causar impacto.

Como em muitos filmes de terror, há um momento de ruptura que altera drasticamente o tom. Essa transição é sutil, mas pode dividir opiniões. Fãs do terror psicológico podem estranhar a abordagem mais direta e explícita que surge nesse ponto. Paradoxalmente, essa virada traz mais dúvidas do que respostas, como uma sequência de camadas que se desdobram continuamente. No entanto, esse acúmulo culmina em um desfecho aquém do esperado, prejudicado por sua verborragia. Os diálogos extensos que funcionaram no início retornam no clímax, mas sem o mesmo impacto.

“Herege” deixa claro desde sua premissa que o cerne da narrativa é um embate religioso. Ainda assim, o filme surpreende pela forma respeitosa com que aborda as diferentes crenças, evitando deboche ou caricaturas. Em suma, entre acertos e deslizes, o longa se destaca por seu texto intelectualmente instigante e por entregar uma das atuações mais marcantes da carreira de Hugh Grant.

 

Rafa Ferraz

Engenheiro de profissão e cinéfilo de nascimento. Apaixonado por literatura e filosofia, criei o perfil ‘Isso Não é Uma Critica’ para compartilhar esse sentimento maravilhoso que é pensar o cinema e tudo que ele proporciona.

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