“O Voo do Anjo”: Longa traz Othon Bastos e Emílio Orciollo em bela jornada de cura através da amizade | 2024
Enfrentar o processo do luto é uma tarefa emocionalmente árdua, um desafio diário, e se ele vem acompanhado da culpa, a dificuldade triplica e é preciso ajuda para superá-lo. Depois de uma tragédia familiar esmagadora, Arthur, protagonista de “O Voo do Anjo”, vive esses sentimentos e chega a um ponto em que está prestes a desistir, ele não vê saída para sua dor, muito menos perspectiva de uma luz no futuro. E é quando ele toma uma atitude extrema que, inesperadamente, conhece o professor aposentado Vitor, e a partir daí a vida de ambos começa por mudar e ter novos rumos.
A trama vai de uma simples história de amizade para uma linda trajetória de cura e redenção mútuas com as atuações poderosas do Othon Bastos e de Emilio Orciollo Netto, que vivem os protagonistas com a maestria que lhes é costumeira. Othon é Vitor, um senhor solitário que, apesar de todo o conforto, vive entre a monotonia e a dor. Orciollo interpreta Arthur com muita emoção, um homem mergulhado na depressão que não consegue superar o sofrimento que se instalou em sua vida.
Esse é um drama intimista pautado nas conversas profundas entre os dois amigos, regadas a vinho, música clássica e belas citações poéticas de Augusto dos Anjos (o “poeta da angústia”), papos esses que nos convidam a refletir sobre a vida e sobre como os laços de afeto precisam ser cultivados e muitas vezes podem nos salvar nos piores momentos.
O delicado tema do suicídio é tratado com sutileza e sem julgamento, sob a perspectiva de quem sofre e não enxerga outra opção, porém acaba por ser surpreendido pelo acaso. O acaso é quem comanda nossa trajetória, por mais que façamos planos, ele sempre vem e muda, para melhor ou para pior, o rumo da vida.
A primeira metade do filme é conduzida lindamente, a amizade e evolução dos personagens fluem bem entre risos e lágrimas, apoio e superações inspiradoras. No entanto, na segunda metade há um corte abrupto e a trama se desvia aleatoriamente para uma viagem dos protagonistas até uma vinícola no cerrado; as tomadas aéreas das rochas esculpidas pelo tempo são incríveis e a visita ao produtor de vinhos bem interessante, porém ficam deslocadas da história, que logo em seguida volta ao rumo inicial. Apesar dessa quebra da narrativa, essa é uma boa produção, que toca fundo no coração e na alma de quem já passou pelo luto e experimentou as mudanças por ele trazidas. “O Voo do Anjo” celebra a vida e o reencontro com as pequenas alegrias que fazem tudo valer a pena, é um vôo de duas almas de volta pra plenitude.